Vaticano

Guardião da fé do Vaticano nega obstáculos à luta contra pedofilia

MARÍLIA BANHOLZER
MARÍLIA BANHOLZER
Publicado em 05/03/2017 às 11:50
Leitura:

 / Foto: AFP

Foto: AFP

O guardião da fé no Vaticano, o cardeal alemão Gerhard Ludwig Müller, classificou neste domingo de clichê as insinuações segundo as quais seus serviços dificultam a luta contra os padres pedófilos.

Na quarta-feira, uma vítima irlandesa de abuso sexual de padres, Marie Collins, abandonou seu posto na comissão antipedofilia criada pelo papa Francisco, ao denunciar uma "vergonhosa falta de cooperação"  dentro do Vaticano, especialmente por parte da Congregação para a Doutrina da Fé dirigida por Müller. 

"Acho que é preciso acabar com esse clichê, a ideia de que, de um lado, está o Papa, que quer reformas, e, do outro, um grupo de  resistentes que querem bloqueá-las", afirmou o cardeal conservador em entrevista a jornal italiano Corriere della Sera. 

Segundo Collins, o dicastério (ministério do Vaticano) dificulta a criação, anunciada em junho de 2015, de uma instância encarregada de julgar os bispos que ocultaram os atos de padres pedófilos.

"Era um projeto, mas, depois de intenso diálogo com distintos discatérios envolvidos na luta contra a pedofilia no clero, chegou-se à conclusão de que o discatério encarreado dos bispos já tinha todas as ferramentas para enfrentar possíveis negligências culpáveis", explicou Müller. 

Para Collins, o fato de os serviços de Müller se negarem a seguir uma recomendação aprovada - cujo conteúdo não mencionou - foi o que precipitou sua renúncia ao cargo no grupo de especialistas na luta contra a pedofilia criado pelo papa Francisco.

Sob a presidência do cardeal americano Sean O'Malley, a comissão criada em 2014, que inclui religiosos e leigos, já havia visto a partida há um ano do britânico Peter Saunders, vítima de pedofilia de um parente e dois padres.

Com a saída de Collins, a Comissão Pontifícia para a Proteção de Menores, em grande parte composta de psicólogos, não conta mais com representantes das vítimas.

Em um comunicado, a irlandesa denunciou a "resistência de alguns membros da Cúria (o governo do Vaticano) de trabalhar com a comissão".

"A falta de cooperação, em particular da parte do dicastério mais envolvido na questão da pedofilia foi vergonhosa", acrescentou.

"Apesar da aprovação pelo papa Francisco de todas as recomendações feitas pela comissão, houve recuos constantes", disse Marie Collins.

"No ano passado, uma mera recomendação, aprovada pelo papa Francisco, a respeito de uma pequena mudança no procedimento relativo a assistência às vítimas/sobreviventes, chegou ao dicastério. Em janeiro, soube que a mudança tinha sido recusada. Ao mesmo tempo, um pedido de cooperação sobre uma questão fundamental do trabalho da comissão também foi recusado", detalhou.

"Na esperança de que a comissão tenha sucesso em superar a resistência, para mim esta foi a gota d'água que fez transbordar o vaso", ressaltou.

No entanto, ela aceitou a proposta do cardeal Sean O'Malley de continuar a trabalhar em projetos educacionais dentro da igreja, incluindo aqueles na Cúria e com os novos bispos.

Em uma declaração por escrito, o cardeal O'Malley agradeceu Mary Collins por sua "contribuição extraordinária".

Mais lidas