Ressuscitamento

Jovem pede que corpo seja congelado à espera do avanço da ciência

Rafael Paranhos da Silva
Rafael Paranhos da Silva
Publicado em 18/11/2016 às 18:36
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"Tenho apenas 14 anos e não quero morrer, mas sei que vou morrer", escreveu a jovem londrina / Foto: Reprodução

"Tenho apenas 14 anos e não quero morrer, mas sei que vou morrer", escreveu a jovem londrina Foto: Reprodução

A justiça britânica autorizou o congelamento do corpo de uma jovem que apresentou um pedido pouco antes de sua morte por câncer, com o sonho de ressuscitar graças aos avanços da ciência, uma decisão legal sem precedentes no Reino Unido.

"Tenho apenas 14 anos e não quero morrer, mas sei que vou morrer", escreveu a jovem londrina em sua demanda.

"Acredito que ser preservada em criogenia me dá uma oportunidade de cura e de acordar, mesmo que seja em centenas de anos".

A jovem recorreu à justiça para assegurar que sua mãe, que apoiava a ideia, tivesse a última palavra sobre o destino de seu cadáver. Ou seja, se tratava, na verdade, de um conflito mais familiar do que científico, visto que centenas de pessoas, inclusive britânicas, foram congeladas.

Os pais da garota estão divorciados e, inicialmente, o pai era contrário ao plano, mas durante o processo acabou por aceitar a ideia.

O juiz da Alta Corte Peter Jackson decidiu a favor da jovem após uma audiência privada em outubro, cujo resultado foi divulgado nesta sexta-feira.

A jovem demandante pediu que nenhum nome envolvido no processo fosse identificado.

A adolescente estava muito doente para comparecer ao tribunal e faleceu pouco depois, mas tendo conhecimento da decisão favorável do juiz, de acordo com a defesa. O cadáver foi levado para os Estados Unidos, onde existem centros dedicados à conservação dos corpos com a esperança de que a ciência consiga ressuscitá-los algum dia.

Quando foi informada sobre a decisão, em 6 de outubro, a adolescente "ficou feliz", contou sua advogada, Zoe Fleetwood, à rede de televisão britânica BBC.

"Queria ver o juiz, que lhe visitou no dia seguinte. Conversamos após o encontro e ela se referiu a ele como 'o senhor herói Peter Jackson'", acrescentou.

Perguntas da ciência à lei

"Não é uma surpresa que esta demanda seja a primeira deste tipo a chegar à justiça neste país, e provavelmente em qualquer outro", afirma o juiz Jackson em sua decisão.

"É um exemplo das novas perguntas que a ciência apresenta ao direito, talvez, mais do que qualquer outro, ao direito familiar", acrescenta Jackson.

O magistrado descreveu o caso como uma "combinação trágica" da doença de uma jovem e um conflito familiar, elogiando a coragem da demandante.

A filha não teve contato com o pai nos últimos oito anos de sua vida, mas ele expressou inquietação com o custos e as consequências de sua decisão.

"Mesmo que o tratamento tenha êxito e a devolva à vida, digamos, em 200 anos, poderia estar sem nenhum parente nem lembrar de nada", disse o pai ao juiz antes de terminar por aceitar a vontade da jovem.

Sem garantia de sucesso

Segundo o jornal britânico The Times, os avós maternos pagarão as 37.000 libras (46.000 dólares) que custará o tratamento, que está sendo realizado nos Estados Unidos pelo Instituto de Criogenia, em Michigan.

Esta organização confirmou ter recebido, em 25 de outubro, o corpo, que será resfriado a 196º negativos e mantido em nitrogênio líquido, à espera de uma eventual ressuscitação.

O Instituto de Criogenia foi criado em 1976 pelo professor de física americano Robert Ettinger, considerado o pai da criogenia, e que foi congelado após sua morte, em 2011, aos 92 anos.

Ettinger desenvolveu a teoria de que "é possível conservar o cadáver indefinidamente", de modo que um dia "a ciência médica possa reparar os danos causados pela doença e pela criogenia".

O Instituto, que conta com uma centena de corpos congelados, deixa claro que não pode garantir o sucesso do tratamento.

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