Opinião

Papa sofre preconceito ideológico, diz autor de livro-entrevista

Rafael Paranhos da Silva
Rafael Paranhos da Silva
Publicado em 26/01/2016 às 22:17
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Vaticanista critica grupos ‘Francisco-fóbicos’ e diz que líder da Igreja reage bem a pressões / Foto: AFP

Vaticanista critica grupos ‘Francisco-fóbicos’ e diz que líder da Igreja reage bem a pressões Foto: AFP

O vaticanista Andrea Tornielli lançou recentemente no Brasil “O nome de Deus é misericórdia” (Planeta), livro-entrevista onde ouve o Papa Francisco sobre perdão, fé e outros temas.

O que mais o impressionou durante a entrevista com o Papa?

Sua ternura, sensibilidade e senso de acolhimento a qualquer pessoa à sua frente. Em um dia quente de verão, me pediu para tirar o casaco. Depois, vendo que eu não tinha papel para anotar, queria se levantar e pegar algum para mim. São pequenas coisas que mostram atenção. Ele vê as necessidades das pessoas.

Qual é a essência de “O nome de Deus é misericórdia” (lançado pela Ed. Planeta)?

Acredito que comunica o coração do Papa e o rosto de um Deus que busca um encontro com o homem. A mensagem da misericórdia tem um valor social e político. Como explicou João Paulo II, não há paz sem justiça e não há justiça sem perdão.

A única pergunta polêmica que o senhor fez ao Papa foi sobre homossexuais. Francisco determinou o que seria abordado?

Não. E ele respondeu a todas as perguntas. Eu não buscava um furo, uma palavra ou uma frase que pudesse ser usada em um título de jornal.

Em março, ele completa três anos de pontificado. Como o senhor avalia este período?

São três anos muito interessantes, cheios de iniciativas, muitos projetos que começaram e outros que foram concluídos. Alguns exemplos são a reforma financeira e administrativa da Santa Sé, a decisão do Papa de nomear nove cardeais para aconselhá-lo, a reforma estudada na Cúria... Mas o que o Papa mais quer é uma atitude diferente por parte da Igreja, que encontre e se aproxime das pessoas que sofrem. E tudo isso está ligado ao perdão e a misericórdia.

No “novo VatiLeaks”, foram revelados casos de desvios de doações. A corrupção continua sendo um grande problema, mesmo após reformas?

Acho que a corrupção deixará de ser uma das grandes emergências depois da reforma no Instituto para as Obras de Religião (o chamado Banco Vaticano), com medidas por transparência e para atender a normas internacionais. Os documentos do VatiLeaks são de coisas antigas, já resolvidas. Mas a corrupção permanece um problema.

Ele é considerado por muitos um Papa revolucionário. Como o senhor o define?

Não gosto da palavra “revolucionário”. O sentido pode ser instrumentalizado. E tivemos Papas que mudaram muitas coisas. Francisco é reformista: a Igreja sempre tem que ser reformada.

Desde o início, Francisco critica em público a Cúria, que diz ser um centro de intrigas. Como é esta relação?


Em 2014, o Papa citou problemas e doenças da Cúria. Neste ano, mostrou as curas e falou de coisas boas. Vive rodeado de colaboradores, denuncia e sabe o que acontece. Mas diz que há uma grande maioria que trabalha com enorme senso de serviço e fidelidade a sua visão.

A ruptura de Francisco com tradições aprofundou o racha entre reformistas e conservadores? Fala-se de uma guerra contra ele...

Há grupos que fazem forte resistência e têm preconceito ideológico. Quais são as tradições que Francisco rompeu? O fato de que não usa carro grande? Isso é uma tradição da Igreja? Questionam por que ele rezou numa mesquita. Bento XVI e João Paulo II fizeram o mesmo. Esses grupos “Francisco-fóbicos” caem no ridículo. Buscam meios de fazer mal ao Papa.

E como o Pontífice reage?


Totalmente tranquilo. Me parece um homem que sabe que a Igreja é guiada por Deus, e não por ele. Não é novidade que haja resistência interna. Isso aconteceu com diferentes Papas nos últimos 60 anos.

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