Júri popular

Trio de canibais começa a ser julgado e pode pegar mais de 30 anos de prisão

Amanda Miranda
Amanda Miranda
Publicado em 11/11/2014 às 16:35
Leitura:

Julgamento começa nesta quinta / Arte: Bruno de Carvalho/NE10

Julgamento começa nesta quinta Arte: Bruno de Carvalho/NE10

Dois anos e meio após a descoberta de um dos crimes mais chocantes da história de Pernambuco, o trio que ficou conhecido como "canibais de Garanhuns", acusado de matar, esquartejar e comer a carne de três mulheres, vai a júri popular nesta quinta-feira (13), no Fórum de Olinda, na Grande Recife, por um dos casos. O processo em questão é o assassinato de Jéssica Camila da Silva Pereira, 17 anos, que aconteceu em 2008 e só foi descoberto quatro anos depois. A expectativa é de que o julgamento tenha duração de dois dias e não há previsão se os réus confessarão o crime.

Jorge é autor do diário que intitulou

Jorge é autor do diário que intitulou "Relatos de um esquizofrênico", em que descreve rituais e o crime contra JéssicaReprodução: Alexandre Gondim/JC Imagem

O júri está marcado para as 9h (horário de Pernambuco) e começa com o sorteio dos jurados que vão compor o Conselho de Sentença. São selecionados sete entre os 25 convocados. Depois, há a leitura da denúncia pela juíza titular da 1ª Vara do Tribunal do Júri de Olinda, Maria Segunda Gomes de Lima, que presidirá o julgamento. 

ESPECIAL:
Entenda o caso dos canibais

Segundo os autos do processo, Jorge Beltrão Negromonte da Silveira, 52 anos; Isabel Cristina Torreão Pires, 53; e Bruna Cristina Oliveira da Silva, 28, são acusados de matar e esquartejar a moradora de rua Jéssica Camila da Silva Pereira, à época com 17 anos, em maio de 2008, na casa onde moravam, no bairro de Rio Doce, em Olinda. Eles também são acusados de comer a carne do corpo.

Para o Ministério Público de Pernambuco (MPPE), o assassinato foi provocado pelo desejo de Isabel e Jorge - casados há mais de 30 anos - de ter filhos. O objetivo de atrair Jéssica, então, seria ficar com a filha dela, então com um ano. Depois do assassinato, Bruna assumiu a identidade de Jéssica e o trio passou a criar a filha da vítima, além de haver falsificado os documentos da menina, que ficou com eles por quatro anos, até o crime ser descoberto.

Essa tese deverá estar no depoimento da primeira testemunha ouvida no julgamento, o delegado Paulo Berenguer, responsável pelas investigações em 2012. A outra testemunha arrolada pela acusação é o psiquiatra forense Lamartine de Hollanda, médico que assinou o laudo psiquiátrico. O exame de sanidade mental apontou que nenhum dos três réus sofre de doença mental, o que os coloca como imputáveis, ou seja, podem responder pelos crimes se condenados. Hollanda também foi convocado pela defesa.

O interrogatório de Jorge, Bruna e Isabel será depois. Os acusados, que confessaram os crimes durante as investigações da Polícia Civil de Pernambuco, resolveram usar o direito de ficar calados em juízo, durante as audiências de instrução realizadas no Fórum de Olinda para ouvir também familiares deles e da vítima, conhecidos deles e até uma mulher que supostamente seria alvo do trio.

Os advogados de defesa não adiantam se, no dia do julgamento, eles voltarão a falar sobre os homicídios. A expectativa da promotora Eliane Gaia é de que eles confessem os crimes.

Após o interrogatório, começará provavelmente a parte mais longa do júri, em que o Ministério Público e a defesa terão até nove horas para debater. Quem falará primeiro, em tempo máximo de duas horas e meia, é a promotora.

A representante do MPPE usará como prova as mídias da confissão dos acusados à polícia, o resultado do exame de DNA dos ossos encontrados na casa no bairro de Rio Doce e o diário escrito por Jorge Beltrão no qual descreve o assassinato de Jéssica. Porém, tentando incriminá-los, pretende usar o resultado do laudo de sanidade, documento que mostra que eles têm consciência do crime e vontade de executá-lo. Referindo-se a Jorge, diz: "Ele tem uma personalidade perversa; é frio, calculista, manipulador. Ele nunca foi anormal, mas muito inteligente".

Trio criou a filha de Jéssica como se fosse dele

Trio criou a filha de Jéssica como se fosse deleReprodução: Bobby Fabisak/Arquivo

A fase de debate do julgamento continuará com a argumentação da defesa. Juntos, terão mais duas horas e meia para falar os advogados de Jorge, a defensora pública Tereza Joacy; de Isabel, Paulo Sales; e de Bruna, Rômulo Lyra, Isis Cordeiro Aires, Ianara Rodrigues e Hellanderson Wilker. A defensora do homem tido como líder do trio preferiu não adiantar qual será a estratégia utilizada, enquanto o de Bruna deverá tentar uma diminuição na pena. Se houver réplica, cada parte terá mais duas horas para falar.

Se o trio for condenado, a pena pode passar de 30 anos. Os crimes pelos quais respondem são homicídio quadruplamente qualificado (motivo torpe, uso de meio cruel, impossibilidade de defesa da vítima e assegurar a impunidade de outros crimes), além de vilipêndio (agressão ao cadáver) e ocultação do corpo. Bruna ainda é acusada de falsidade ideológica, por ter assumido a identidade de Jéssica após a sua morte.

Com 11 anos de atuação em tribunais do júri e mais duas décadas como delegada e escrivã de polícia, a juíza Maria Segunda espera que o júri aconteça com tranquilidade. "O fato é incomum, mas o formalismo usado é igual ao de tantos outros processos. Vamos organizar para a realização com ordem e disciplina", afirma a magistrada conhecida pela firmeza nos posicionamentos.

Aguardando o julgamento, Jorge está no pavilhão J do Presídio Marcelo Francisco de Araújo, no Complexo Prisional do Curado, no Recife, um local separado da unidade. "Ele tem um comportamento muito tranquilo. Geralmente fica calado, não é muito de estar conversando", afirma o diretor Lucas da Silva. Isabel e Bruna estavam na Colônia Penal de Buíque, no Agreste pernambucano, mas foram trazidas para Abreu e Lima, na Grande Recife, por causa do julgamento.

Mais lidas