O crime

Canibais atraíram vítima com oferta de emprego para ficar com filha

Amanda Miranda e Malu Silveira
Amanda Miranda e Malu Silveira
Publicado em 11/11/2014 às 14:55
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Para a polícia, filha de Jéssica era um dos objetivos do trio / Reprodução: Bobby Fabisak/JC Imagem

Para a polícia, filha de Jéssica era um dos objetivos do trio Reprodução: Bobby Fabisak/JC Imagem

Jéssica Camila da Silva Pereira tinha apenas 17 anos quando conheceu Jorge Beltrão, Isabel Pires e Bruna Oliveira - hoje com 52, 53 e 28 anos, respectivamente. Menina que vagava pelas ruas em Boa Viagem, na Zona Sul do Recife, com a filha de 1 ano a tiracolo, Jéssica ganhava a vida vendendo doces nos semáforos do bairro. O pai dela, Seu Emanuel, era catador de lixo e acompanhava a jovem diariamente. No início de 2008, Jéssica conheceu Isabel pelas ruas do bairro. Três meses depois, essa aproximação terminou em tragédia num ritual macabro.

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A aproximação de Dona Bel, como era conhecida, não era à toa, acredita a polícia. Segundo o delegado Paulo Berenguer, responsável pelo inquérito, ela tinha interesse pela jovem por causa da criança. "Eles queriam a menina. Jorge e Bel alimentavam esse desejo de ter um filho", conta sobre o casal. Depois de muita conversa, a acusada conseguiu convencer Jéssica a trabalhar para o trio como doméstica. A argumentação fazia parte da função de Isabel de atrair as vítimas, descrita nos depoimentos dos acusados à polícia. Com uma proposta de salário acima da média, a jovem logo aceitou - mesmo contra a vontade do pai. Perdeu o contato com os familiares e, a partir de então, passou a viver, junto com a filha, com os três na casa em que eles residiam, na 5ª etapa de Rio Doce, em Olinda, na Grande Recife.

No dia a dia ao longo dos três meses em que morou com o trio, Jéssica ajudava Isabel e Bruna nos afazeres domésticos e cuidava da filha. Nem imaginava que o trio já planejava o seu assassinato. Munida da Certidão de Nascimento da jovem, Bruna Oliveira, amante de Jorge, tirou uma segunda via do documento como se a própria fosse Jéssica Camila. Depois emitiu vários documentos oficiais falsos - assumindo a identidade da vítima.

O segundo passo do trio foi registrar a criança como filha de Jorge e a falsa Jéssica  Feito isso, o trio raciocinou: a verdadeira Jéssica já não era mais necessária e tratou de matá-la. O  assassinato foi relatado em detalhes por Jorge no seu livro Relatos de um Esquizofrênico, peça-chave na apuração do caso. "O livro, entre vários encontrados no mandado de busca e apreensão em Garanhuns, foi uma das provas de que o crime foi premeditado", ressaltou Berenguer.

De acordo com as investigações, Jéssica pode ter sido assassinada entre as noites de 24 e 26 de maio de 2008. “Ela se arrumou e, no momento em que se preparava para sair de casa, houve um desentendimento. Foi aí que eles decidiram que seria o momento certo para executar os planos”, afirma a promotora Eliane Gaia, responsável pela acusação do trio. “Bruna estava com ciúmes de Jéssica, por causa de Jorge, e Isabel ficaria com a criança. Seria tudo perfeito para elas”, acrescenta.

Em 2012, acusados foram levados à casa onde viveram com Jéssica em Olinda. Ossos da vítima foram encontrados no local

Em 2012, acusados foram levados à casa onde viveram com Jéssica em Olinda. Ossos da vítima foram encontrados no localFoto: Igo Bione/JC Imagem

Apesar de Jéssica sido a primeira vítima dos acusados, o assassinato da jovem só foi elucidado quatro anos depois. Os restos mortais dela foram encontrados em três áreas da residência em Rio Doce - todas apontados pelo trio. O caso só veio à tona com a descoberta, em abril de 2012, dos homicídios de Giselly Helena, 21 anos, e Alexandra da Silva Falcão, 20. "Tive que fazer um recorte histórico. É como se eu tivesse vendo um filme de trás para frente. Tive que retroagir para entender o que estava acontecendo", explicou o delegado. 

Jéssica, assim como as outras duas mulheres, foi assassinada com uma facada no pescoço. O ataque causou hemorragia na vítima, que morreu poucos minutos depois. Jorge esperava todo o sangue escorrer dos corpos para então esquartejar as jovens. Acreditava, assim, que a carne estava purificada. Depois, segundo depoimentos dos acusados à polícia, o trio comia partes dos corpos das vítimas em um ritual que integrava a seita O Cartel, criada por Jorge e que teria, como um dos objetivos, o controle populacional. Apenas as mãos e os pés eram considerados impuros - e foram justamente os ossos encontrados escondidos na casa em Olinda.

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