#PassageirosdoMedo

Número de assaltos a ônibus no Grande Recife subiu 38,25% no primeiro semestre de 2016

Mayra Cavalcanti
Mayra Cavalcanti
Publicado em 02/08/2016 às 8:30
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De acordo com o sindicato dos rodoviários, de janeiro a junho de 2016, foram 843 assaltos. Já segundo a SDS, 506 coletivos foram alvos / Foto: Diego Nigro/JC Imagem

De acordo com o sindicato dos rodoviários, de janeiro a junho de 2016, foram 843 assaltos. Já segundo a SDS, 506 coletivos foram alvos Foto: Diego Nigro/JC Imagem

A Secretaria de Defesa Social (SDS) e o Sindicato dos Rodoviários de Pernambuco não chegam a um acordo quando o assunto é o número de assaltos a ônibus ocorridos na Região Metropolitana do Recife (RMR). Para o sindicato, de janeiro a junho de 2016, foram 843. Já segundo a SDS, 506 coletivos foram assaltados. Independentemente de quem faça a contagem, os dois números passam a mesma informação: a insegurança no transporte coletivo é um tema que virou preocupação das autoridades, da população e da imprensa. Nesta terça-feira (2), dia em que o número de assaltos a ônibus chega a 1002, contabilizados pelo Sindicato, o JC Trânsito inicia, seguindo até a próxima sexta-feira (5), a série de reportagens "Passageiros do Medo".

As quatro matérias que integram esta série foram produzidas pelas repórteres Mayra Cavalcanti e Larissa Alves e tratam sobre os números de assaltos, os impactos do aumento deles na vida da população e dos funcionários que trabalham no transporte coletivo na RMR, além de abordar quais as medidas que estão sendo tomadas pelo Governo e pelas empresas de ônibus para conter este tipo de violência.

Quase três coletivos são assaltados no Grande Recife por dia

Não há como negar: o número de assaltos a ônibus na RMR aumentou, e muito, em relação ao primeiro semestre de 2015. De acordo com a SDS, o crescimento foi de 38,25%, contabilizando 506 investidas de bandidos, o que resulta em uma média de quase três assaltos por dia. De janeiro a maio deste ano, lideravam o ranking de linhas que sofreram mais investidas a 203 - Zumbi do Pacheco/Barro (Loteamento), a 409 - Barra de Jangada/Curado e a 216 - TI Barro/TI Cajueiro.

Neste mesmo período, os locais onde os coletivos foram mais abordados por assaltantes foram a BR-101 Sul (70), seguida da Avenida Agamenon Magalhães (44) e pela antiga BR-101 Sul (38), em Pontezinha, no Cabo de Santo Agostinho, na RMR. O sábado e o domingo lideram juntos a lista de dias mais perigosos, com 108 assaltos cada. Os horários mais perigosos são as 19h, 21h e 20h.

Os dados foram divulgados em junho no blog De Olho no Trânsito. A reportagem entrou em contato com o Grande Recife Consórcio de Transporte para solicitar os números atualizados, mas a responsabilidade pelos dados foi repassada para a SDS que, por sua vez, declarou não divulgar estas informações, por elas serem preservadas para fins de operacionalização das ações policiais.

SINDICATO - Conflitante com o divulgado pela SDS, o número de assaltos a ônibus de janeiro a junho de 2016 de acordo com o Sindicato dos Rodoviários é de 843, uma média de quatro por dia. O mês em que houve maior quantidade de investidas dos bandidos foi janeiro, com 175 assaltos, seguido por abril, com 156. Fevereiro foi o mês com o menor número (75), considerando também que é o mês com menos dias. Em comparação com 2015, foram 31% mais assaltos na RMR.

No último dia 20 de julho, o Sindicato dos Rodoviários realizou um protesto contra a falta de segurança nos coletivos no Grande Recife. A manifestação foi motivada por um assalto que resultou em um passageiro esfaqueado dentro do coletivo da linha Vila da Sudene, da empresa Vera Cruz. Segundo Benilson Custódio, presidente do Sindicato dos Rodoviários de Pernambuco, a tendência é que os números aumentem ainda mais. 

"Já tivemos diálogo com o Governo e até agora nada melhorou. A gente pede mais policiamento, principalmente durante a noite, com mais blitzes. Além disto, gostaríamos que houvesse detector de metais nos coletivos", afirma. Para Benilson, falta esforço do poder público. "Se você observar a quantidade de veículos que foram revistados na Operação Transporte Seguro e a quantidade de apreensões, dá para notar o quanto é o resultado da operação. É preciso que seja intensificada, é preciso mais esforço" acrescenta.

Para justificar a diferença entre as contabilidades, o Sindicato afirma que os assaltos são contados a partir dos números repassados pelas empresas de ônibus. Além disto, o Sindicato diz que o órgão do Governo do Estado apenas contabiliza assaltos quando são roubadas as rendas dos coletivos. A SDS declarou que contabiliza os assaltos a partir de Boletins de Ocorrência registrados por pessoas jurídicas, ou seja, empresas, mas que os BOs feitos por pessoas físicas também são levados em conta. 

Questionamos o Sindicato das Empresas de Transportes de Passageiros no Estado de Pernambuco, Urbana-PE, sobre a obrigatoriedade dos profissionais em realizarem o BO, independente da renda do coletivo ter sido levada ou não, e, em nota, a empresa explicou que é fundamental a informação destes assaltos para que um panejamento policial seja feito. Leia na íntegra:

A Urbana-PE entende que a informação é fundamental para planejamento da ação policial e combate aos assaltos. Os eventos ocorridos no interior dos veículos devem ser sempre registrados.

Relato da repórter

(Mayra Cavalcanti)

Chorar era a única coisa que conseguia fazer depois que o assaltante desceu do coletivo, que fazia a linha Campo Grande (Afogados). Era um sábado de manhã do ano de 2014. Estava seguindo para a casa da minha amiga, onde iríamos fazer um trabalho de fotografia da faculdade. Estava com minha câmera profissional na bolsa. Meu celular e também um relógio.

Tinha acabado de falar com minha mãe, que estava viajando, e, pela última vez dentro de um ônibus, coloquei música para tocar no fone de ouvido. Fazia isto há anos, mas aquela foi a última vez. O coletivo parou em uma parada na Bomba do Hemetério, na Zona Norte do Recife, e um homem de blusa roxa, cabelo com mechas louras e um revólver na mão subiu. São as únicas coisas de que lembro. Como a música estava alta, não ouvi o anúncio de assalto. Mas ao ver a arma de fogo, meu coração disparou. 

Imediatamente, guardei o celular na bolsa. Ele não viu, mas passou uma sacola de plástico para que os passageiros colocassem os seus celulares. Eu estava na primeira fila e acabei pegando a sacola, mas nada coloquei dentro. Me arrisquei e não indico. Ele só conseguiu ver meu relógio. Era bonito, dourado. Prontamente, pediu para que todos colocassem os relógios também. Obviamente, tirei e coloquei na sacola. 

Não bastou isso tudo, o assaltante ainda passou 10 minutos mandando o ônibus ir deixá-lo onde ele queria, no caso, em Chão de Estrelas. Ele desceu e minhas lágrimas também. Uma mistura de vários sentimentos tomaram conta de mim. Fiz o Boletim de Ocorrência, mas passei o resto do dia sem conseguir falar direito. Só chorar. Como não tinha outra opção de locomoção à época, tive que continuar andando de ônibus. Lembro que colocava todos os objetos escondidos no meu corpo, na esperança de que eles não fossem mais tirados de mim. 

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