Discurso de ódio

Sensação de insegurança faz crescer apologia à violência nas redes sociais

MARÍLIA BANHOLZER
MARÍLIA BANHOLZER
Publicado em 02/09/2015 às 12:02
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Redes sociais são o principal canal onde a população descarrega suas frustrações com a impunidade  / Foto: reprodução

Redes sociais são o principal canal onde a população descarrega suas frustrações com a impunidade Foto: reprodução

Os recentes casos de violência no Recife têm gerado uma onda de comentários de incentivo à violência, seja nas redes sociais ou em conversas entre amigos. Algumas postagens pedem pena de morte, fazem ataques àqueles que defendem a manutenção dos direitos humanos e muitos outros discursos de ódio. De acordo com a Secretaria de Defesa Social de Pernambuco, somente nos três primeiros meses deste ano, 982 pessoas foram assassinadas no Estado, uma média de 10,9 por dia. São 154 mortes a mais do que no mesmo período do ano passado. Com isso, o sentimento de insegurança e de impunidade podem estar por trás desse comportamento.

Para a psiquiatra Susana Azoubel, “a banalização da vida humana, que segue junto à impunidade no Brasil em todas as esferas, acrescida ao anonimato possibilitado pelo uso de redes sociais, facilita a exposição de sentimentos preconceituosos, de sentimentos de ódio, de apologia ao crime.”


Foto: Reprodução do Facebook oficial do NE10

Perito forense há mais de 30 anos no Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico do Estado, em Itamaracá, o psiquiatra Feliciano Abdon pontua que o caráter das pessoas é fruto de heranças de seus familiares e dos locais onde vivem. “Não existe ninguém totalmente bom ou totalmente mau. Todos somos uma junção de vários sentimentos, inclusive aqueles que não são tão nobres. Então, a partir do momento em que estamos cercados de tanta violência, não é incomum que pessoas acreditem que a violência possa ser o caminho para acabar com a própria violência”, observa.

Os dois psiquiatras concordam que há riscos de esse comportamento exacerbado nas redes sociais se tornar comum nas vidas das pessoas, além da web. “As redes sociais permitem o encontro dos pares, o encontro dos que comungam a mesma ideologia ou o mesmo sentimento de ódio. Embora também haja casos de pessoas que se reúnem para fazer o bem”, comenta Susana Azoubel.


Arte: Marília Banholzer/NE10

Feliciano Abdon alerta que não são raros os casos de pessoas que são tomados por sentimentos ruins e acabam cometendo crimes. “Vejo quase que diariamente situações em que pessoas são presas por um ato criminoso feito por um momento de ódio. Então é preciso combater esse tipo de sentimento para evitar novas tragédias”, avalia o médico.

O que poucos sabem é que o artigo 287 do Código Penal Brasileiro pune com pena de detenção de três a seis meses ou multa o crime de apologia a fato criminoso ou apologia a autor de crime. Trata-se de um delito contra a paz pública que pode ser cometido por qualquer pessoa penalmente responsável. Nos casos em que envolver menores de 18 anos, os pais são responsabilizados pela infração. A infração é consumada no momento em que o autor faz publicações de apologia ao crime - aqui no Brasil, a lei exige que o fato seja explícito, não se admitindo a presunção.  


Arte: Marília Banholzer/NE10

No final do ano passado, foi criado um grupo para monitorar e mapear crimes contra os direitos humanos em redes sociais. O trabalho fica a cargo de um grupo de trabalho lançado pela Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República. O objetivo, segundo a pasta, é receber e analisar denúncias sobre páginas da Internet que promovem o ódio e fazem apologia à violência e à discriminação.

Na época, a então ministra da Secretaria de Direitos Humanos, Ideli Salvatti, avaliou como assustador o crescimento dos crimes de ódio no Brasil. Segundo ela, informes da ONG SaferNet Brasil indicaram aumento entre 300% e 600% no registro desse tipo de violação no País de 2013 a 2014.

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