Falta de material

Sob nova gestão, Hospital das Clínicas sofre para sanar problema antigo

MARÍLIA BANHOLZER
MARÍLIA BANHOLZER
Publicado em 04/06/2015 às 18:24
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Unidade de saúde tem 35 anos de fundação e problemas há mais de duas décadas sem solução / Foto: Diego Nigro/JC Imagem

Unidade de saúde tem 35 anos de fundação e problemas há mais de duas décadas sem solução Foto: Diego Nigro/JC Imagem

Sob nova direção há 18 meses, o Hospital das Clínicas (HC) não consegue emergir da crise. Vinculada à Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), a unidade de saúde viu, neste período, antigos problemas estruturais serem resolvidos enquanto questões consideradas inaceitáveis persistem. Por um lado, o local voltou a contar com os elevadores, que garantem uma melhor mobilidade dos pacientes entre os 11 andares do prédio, além de outras melhorias estruturais como a desobstrução do subsolo onde havia entulhos que estavam lá desde a época da inauguração, há mais de 30 anos. Por outro, funcionários e pacientes denunciam a falta de medicamentos e material para curativos e cirurgias.

Em tratamento contra uma úlcera, o paciente Carlos Roberto confirma que muitas vezes é preciso levar de casa o material necessário para fazer curativo, caso contrário fica sem o procedimento por falta de material médico. Já Adriana Silva, que também vai frequentemente à unidade para receber medicação, revela que além de ataduras, algodão, luvas e outros, o Hospital das Clínicas vem sofrendo com a falta de remédios para os pacientes. “Falta demais remédio e coisas para curativo. Tem que comprar sem poder, pedir à família. Eu sempre venho buscar Fosfato de Codeína ou Fosfato de Dipirona, mas quase nunca consigo. Pra quem ganha um salário mínimo, isso pesa no orçamento”, resumiu.

Em pouco mais de ano à frente do hospital não há como resolver problemas que perduram há mais de 20 anosFrederico Jorge, superintendente HC
O superintendente do HC, Frederico Jorge Ribeiro, confirma que vem tentando resolver questões que assombram as administrações do hospital há décadas. “No aspecto de infraestrutura a gente tirou o hospital do fundo do poço. Ele ainda não está bom, sabemos disso, e vai demorar um bom par de anos para ter um hospital decente. No ponto de vista administrativo financeiro temos um grave problema no abastecimento de materiais”, admitiu.

Ele ainda explicou que a falta de materiais é reflexo de anos de má gestão dos insumos. “Teve desabastecimento sim, mas é porque o abastecimento era feito de maneira intuitiva por pessoas que trabalham aqui há anos. Elas olhavam ao redor e faziam uma média de materiais que achavam que iam gastar, quando dava certo ótimo, quando não, faltava. Hoje tentamos profissionalizar esse procedimento e esbarramos em alguns problemas com fornecedores que, muitas vezes, não entregam no prazo”.

Desde dezembro de 2013, a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh) é responsável pela administração dos hospital. No entanto, a nova forma de gerir a unidade não tem conseguido sanar a situação de falta de material para os profissionais de saúde trabalharem. No início deste ano, residentes de todas as áreas prepararam uma carta em que relatam a situação precária do HC e encaminharam a demanda ao Ministério Público Federal.

Sintufepe sobre Ebserh: "Esta empresa foi vendida como solução para o caos que estava dentro do hospital e até agora ela não disse para que veio"
O coordenador de Comunicação e Imprensa do Sindicato dos Trabalhadores das Universidades Federais de Pernambuco (Sintufepe), Guilherme Costa Neto, questionou os serviços prestados pela (Ebserh) à frente da gestão da unidade de saúde. “Esta empresa foi vendida como solução para o caos que estava o hospital e até agora ela não disse para que veio. Queremos a rescisão do contrato porque ela não está dando conta. Para maquiar colocaram porcelanato nas portarias, que é um piso inadequado para um hospital já que alguém pode escorregar, também estão pintando, mas a estrutura ainda tem que melhorar”, criticou.

Superintende do HC admite que ainda há muito para ser feito

Superintende do HC admite que ainda há muito para ser feitoFoto: Alexandre Gondim/JC Imagem

Em defesa da atual forma de administração, o superintendente ressaltou que “as pessoas criaram uma esperança muito grande na Ebserh”. Disse ainda que “em pouco mais de um ano à frente do hospital não há como resolver problemas que perduram há mais de 20”. Frederico Jorge ainda comentou que os hospitais universitários de todo País sofrem com falta de estrutura, finanças defasadas, insuficiência de recursos humanos e desatualização do parque tecnológico. “A Ebsher é uma proposta de gestão. O modelo foi concebido após uma força tarefa de três ministérios para dar uma solução mais adequada aos problemas de gestão”.

Com uma história 35 anos de fundação, a instituição ocupa uma área física construída de 62 mil m², localizada na Cidade Universitária, Zona Oeste do Recife. A unidade é considerada referência em tratamento de alta complexidade em oncologia, dermatologia, cardiologia, angiologia e muitas outras especialidades médicas. “O modelo de gestão da Ebserh bate de frente com os interesses de muita gente. Implantamos ponto eletrônico, que era para ser usado desde 1998 e nunca foi usado, a forma de contratação encerra a possibilidade de uma carreira de servidor público, agora são contratações que permitem o desligamento caso funcionário não esteja agradando à gestão, enfim, são coisas que incomodam”, alertou o superintendente Frederico Jorge Ribeiro.


Fonte: Hospital das Clínicas de Pernmabuco. Arte: Guilherme Castro/NE10

Paciente usa os serviços do HC há cerca de 30 anos e ama o hospital

Paciente usa os serviços do HC há cerca de 30 anos e ama o hospitalFoto: Marília Banholzer/NE10

OS PACIENTES - A trabalhadora rural Telma Lopes da Silva tem 54 anos e há mais de 30 é paciente do Hospital das Clínicas. Diagnosticada e tratada com um câncer no colo do útero, hoje ela combate um câncer na vulva. Telma, que reside no município de Vicência, na Zona da Mata do Estado, a 87 km do Recife, vai à unidade a cada seis meses e contou que nunca teve problemas com o atendimento do hospital ou falta de insumos para qualquer procedimento. “Para mim, esse é o melhor hospital de Pernambuco. Se não fossem os médicos daqui, se não fosse o hospital, eu não estaria viva". Já o funcionário público Jorge Ferreira, 52, há quatro vai frequentemente à unidade para se submeter ao tratamento contra um câncer nas narinas. Para ele não há o que reclamar: “O atendimento é bom, só é demorado. Mas o tratamento e a estrutura é muito boa. Nunca me faltou material ou medicamento. Tudo ótimo”, avaliou.

CONTRATAÇÕES - Com a proposta de recompor o quadro de pessoal do Hospital das Clínicas, a atual gestão realizou um concurso público em 2014 para a contratação de 690 profissionais de diversas áreas, das quais 388 já foram incorporadas ao quadro de funcionários. Essas pessoas contratadas pela empresa são vinculadas ao regime da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e fazem jus aos salários e benefícios dos planos de Cargos, Carreiras e Salários e de Benefícios da Empresa. Os servidores públicos em exercício do HC/UFPE, após a assinatura do contrato, continuarão exercendo as mesmas atividades e sujeitos ao regime previsto na Lei 8.112/1990. 


Foto: Alexandre Gondim/JC Imagem

MARCAÇÃO DE CONSULTAS - O Hospital das Clínicas disponibiliza um quantitativo de vagas reguladas para determinadas áreas médicas. Para marcar a primeira consulta em alguma dessas áreas, o paciente deve primeiramente se dirirgir a uma unidade de saúde, como um Posto de Saúde ou uma Unidade de Pronto Atendimento (UPA) para agendar consulta através do sistema de regulação. No dia agendado, o usuário precisa ter em mãos o comprovante de agendamento, identidade, CPF, Cartão SUS, comprovante de residência e certidão de nascimento (para menores de 16 anos que não tenham documento de identidade) e se dirigir à Central de Marcação de Consultas, localizada no térreo da Portaria 4 do HC. No local, será realizado o cadastro ou o prontuário do paciente e ele será, de imediato, direcionado ao ambulatório específico para atendimento. As interconsultas (aquelas em que um médico do HC solicita o encaminhamento do paciente para outro especialista do próprio hospital), novas consultas para as demais especialidades da unidade e os retornos continuam sendo agendados presencialmente no HC. Outras informações através do 2126.3633.

EBSERH - A Ebsher é uma empresa pública, criada pela Lei 12.550/11, que tem por finalidade a prestação de serviços gratuitos de assistência médico-hospitalar, ambulatorial e de apoio diagnóstico e terapêutico à comunidade, assim como a prestação às instituições públicas federais de ensino ou instituições congêneres de serviços de apoio ao ensino, à pesquisa e à extensão, ao ensino-aprendizagem e à formação de pessoas no campo da saúde pública. Em 11 de dezembro de 2013, a Universidade Federal de Pernambuco assinou o contrato de adesão com a Ebsher. Atualemte, no Brasil, 23 hospitais universitários assinaram contrato de adesão com a Ebserh. No total, o País conta com 47 hospitais universitários vinculados a 33 universidades federais. Em Pernambuco, além do Hospital das Clínicas (HC), ligado à UFPE, o hospital da Universidade Federal do Vale do São Francisco também aderiu ao modelo de gestão da Ebserh. 

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Obrigatoriedade de usar o ponto eletrônico, através do sistema de biometria, garante a presença de profissionais dentro do que estava programado - Alexandre Gondim/JC Imagem
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Atual gestão do Hospital das Clínicas garante ter realizado melhoria nos leitos da unidade de saúde, garantindo mais conforto aos pacientes - Alexandre Gondim/JC Imagem
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Atualmente, as vagas de 15 das 42 especialidades atendidas no hospital são reguladas pela Secretaria de Saúde do Estado. Objetivo é evitar filas - Diego Nigro/JC Imagem
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Em 2013, antes do início da nova gestão, alunos da UFPE e funcionários do HC lutaram contra a Ebserh alegando a que seria uma espécie de privatização - Diego Nigro/JC Imagem

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