Dia do idoso

Servidores públicos idosos desaprovam aposentadoria compulsória

Mayra Cavalcanti
Mayra Cavalcanti
Publicado em 30/09/2014 às 20:00
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Funcionários públicos efetivos devem se aposentar obrigatoriamente ao atingir os 70 anos de idade / Foto: Hélia Scheppa/JC Imagem

Funcionários públicos efetivos devem se aposentar obrigatoriamente ao atingir os 70 anos de idade Foto: Hélia Scheppa/JC Imagem

A paixão pelo ensino da professora aposentada Nilza Sete, de 70 anos, é antiga. Desde a adolescência começou a ensinar e, há 15 anos, na escola Municipal Padre José Anchieta, no bairro da Mustardinha, Zona Oeste do Recife, vinha trabalhando com o estímulo da aprendizagem de alunos com deficiência visual, auditiva e mental, através de jogos e do ensino de libras e braile.

Mas seu septuagésimo aniversário, em janeiro deste ano, trouxe mais do que uma nova idade: ao completar 70 anos, Nilza teve que parar de ensinar em decorrência da aposentadoria compulsória prevista na Constituição Federal. Apesar de não ser novidade para ela, o acontecimento acabou sendo um grande choque. “É uma saída imediata. Eu nem consegui voltar de férias. Parece que estão descartando a gente, quando na verdade a nossa idade não é prova de incapacidade. Ainda me sentia e sinto apta a continuar ensinando”, declara.

De acordo com o advogado Rodrigo Accioly, a Constituição é clara quando determina que todos os funcionários públicos efetivos (não considerando os cargos comissionados) da União, Estados, Municípios e Distrito Federal devem se aposentar obrigatoriamente ao atingir a idade de 70 anos. “No serviço público, atualmente, existe um estímulo financeiro, um adicional, para que o servidor continue trabalhando mesmo que ele já possa se aposentar. Por isso a aposentadoria compulsória acaba sendo uma contradição, um ponto ilógico”, explicou Rodrigo.

Mesmo estando na Constituição, o assunto é alvo de críticas por parte de pessoas que acreditam que a competência não é uma característica exclusiva dos mais jovens. Ainda conforme Rodrigo, para mudar a Constituição, apenas através de uma emenda constitucional. A última tentativa ocorreu em 2005, com a PEC 475/2005, originária da Câmara dos Deputados, que propõe a elevação da aposentadoria compulsória de 70 para 75 anos. A proposta segue sujeita à apreciação do Plenário.

Para a vice-presidente do Conselho Estadual do Direito do Idoso, Edusa Araújo, a aposentadoria compulsória não é democrática

Para a vice-presidente do Conselho Estadual do Direito do Idoso, Edusa Araújo, a aposentadoria compulsória não é democráticaFoto: Reprodução MPPE/Marcelo Ferreira

Para a vice-presidente do Conselho Estadual do Direito do Idoso, Edusa Araújo, a aposentadoria compulsória não é democrática e é um ponto importante a ser tratado no Dia do Idoso, comemorado nessa quarta-feira (01º). “As pessoas que têm mais de 60 anos no século 21 são diferentes daquelas do século passado. A expectativa de vida do brasileiro aumentou e uma pessoa com 70 anos tem plenas condições de ser produtiva. Para mim é uma lei injusta”, defende.

Dados deste ano do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostram que 22,9 milhões de brasileiros são idosos, o que representa 11,34% do total da população. Nos próximos anos, a projeção é de que esse quantitativo triplique, chegando a 39,2% da população.

Com o gradual envelhecimento do brasileiro, a também professora aposentada Eveline Samary, de 70 anos, acredita que a aposentadoria compulsória já esteja obsoleta. Professora de sociologia por 25 anos na Universidade de Pernambuco (UPE), Eveline conta que foi obrigada a se aposentar em março, mas até hoje o fato ainda a incomoda. “Sou a favor da renovação profissional. A questão não é essa. Mas também é preciso valorizar a experiência. A gente recebe uma carta dolorosa dizendo o que não podemos mais fazer, quando ainda temos – e muito - a contribuir”.

Para Nilza e Eveline, a solução para preencher o vazio trazido pela aposentadoria foi o trabalho voluntário. Atualmente Nilza continua com o clube de leitura que já desenvolvia na escola Padre José Anchieta e frequenta a instituição uma vez por semana. Eveline também se envolve, voluntariamente, com eventos da UPE. “Eu me sinto ‘jogada fora’. Para mim, seria mais justo que realizassem um exame de saúde anual para comprovar que a pessoa ainda podia trabalhar. Tudo, menos nos obrigar a ficar parados”, completa Nilza.

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