A mulher e a lei

''Não deixe o homem agressor ser dono da sua vida e da sua morte''

Por Gleide Ângelo
Por Gleide Ângelo
Publicado em 25/09/2017 às 7:40
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Muitas mulheres transformam agressores em Príncipes encantados, que só existem em suas fantasias / Foto: Heudes Régis/JC Imagem

Muitas mulheres transformam agressores em Príncipes encantados, que só existem em suas fantasias Foto: Heudes Régis/JC Imagem

No artigo de hoje falarei sobre mulheres vítimas de violência doméstica e familiar que perderam o controle das suas vidas e simplesmente as colocaram nas mãos de homens agressores. Consigo enxergar isso com muita clareza quando converso com as mulheres e quando recebo diversas mensagens. Observo que muitas mulheres investem em sua carreira profissional, se tornam mulheres respeitadas e conceituadas na sociedade, mas emocionalmente são imaturas. É justamente nessa fraqueza que homens agressores conseguem dominar e fazer com que aquela mulher segura profissionalmente se torne insegura emocionalmente. Essa fragilidade irá interferir em todas áreas da vida da mulher, pois o maior objetivo do homem agressor, dominador é sabotar o crescimento da mulher, tornando-a eterna prisioneira das suas vontades e desejos.

MINHA IRMÃ TINHA TUDO, UMA GRANDE EMPRESÁRIA E FOI MORTA COVARDEMENTE

Quando tomamos conhecimento da violência doméstica, a primeira idéia que vem a nossa mente é de que só ocorre com mulheres pobres, negras, de comunidades carentes e desempregadas. Na realidade, essas são as maiores vítimas da violência doméstica. Porém, há uma parcela grande de mulheres da classe média que sofrem esse tipo de violência. Quando essas notícias chegam ao meu conhecimento, também chega a vergonha de que elas têm de denunciar. Muitas delas são cobradas a deixar o agressor, e principalmente porque não dependem financeiramente deles. Mas, muitas não conseguem, porque nestes casos a dependência não é financeira, é emocional.

Encontrei Carolina (nome fictício) ainda muito abatida, na companhia da sua mãe Ester (nome fictício). A irmã de Carolina, de nome Silvana (fictício) foi vítima de feminicídio quando tinha 28 anos de idade. A maior indagação de Carolina para mim era de que não conseguia entender porque Silvana não deixou o marido Felipe (nome fictício). Ela disse que Silvana era uma grande empresária, tinha independência financeira e não precisava de Felipe para nada. Notei que Carolina e Ester estavam muito emocionadas, e fui deixando-as falar.

Nas palavras de Carolina eu só escutava, porque? porque? porque?, muitas dúvidas para entender porque a irmã permitiu ser assassinada pelo marido. Pedi que ela resumisse o relacionamento de Silvana e Felipe, e Carolina em poucas palavras narrou, "ele era ruim, tinha muita inveja dela. Minha irmã era linda, uma mulher de sucesso, e esse homem só entrou na vida dela para destruir. A primeira coisa que ele fez foi afastá-la de mim e da minha mãe. Silvana mudou, começou a ter raiva da família, foi morar com ele e praticamente perdemos o contato com ela. Quando eu telefonava para ela, sempre a mesma desculpa, estou ocupada, depois ligo. E nunca ligava".

Esse enredo nós já conhecemos, de homens dominadores que isolam as mulheres para fragilizá-las e se tornarem presas fáceis. Emocionada, D. Ester desabafou, "minhas filhas sempre foram muito unidas, só saiam juntas, elas eram felizes. Silvana sempre teve o sonho de ser independente, morar sozinha, e foi isso que fez. Conseguiu abrir uma empresa, estava muito bem financeiramente, comprou um apartamento de luxo, carro, viajava o mundo todo e sempre levava Carolina, que além de ser irmã, era a sua melhor amiga. A desgraça da nossa família foi no dia em que Silvana conheceu esse assassino que acabou com a vida da minha filhinha".

Visivelmente abalada, D. Ester não conseguiu mais falar, só fazia chorar. Então pedi a Carolina que em poucas palavras me dissesse como ocorreu o crime, e ela contou, "eles sempre brigaram muito, Felipe tinha muito ciúme da minha irmã. Ele começou a gastar todo o dinheiro dela com viagens e bebidas, além de traí-la com muitas mulheres. Todos os dias tinham brigas, e ficávamos sabendo disso pelos vizinhos que estavam preocupados. Tentamos muitas vezes nos aproximar dela, mas Felipe não deixava, ele fez com que Silvana ficasse com ódio da família. Eu não consigo entender até hoje o porque de minha irmã não ter deixado aquele homem. Ela não precisava dele para nada. Ele é quem se aproveitava da situação econômica confortável que ela tinha. Algumas vezes os vizinhos chegaram a ligar para o 190 da polícia, mas toda vez que a viatura chegava, ela negava, dizia que era intriga dos vizinhos e que Felipe não tinha feito nada de errado com ela. Por isso, muitos vizinhos resolveram não intervir mais para ajudar".

Perguntei a Carolina sobre a morte de Silvana, e ela narrou, "foi em mais uma dessas brigas. Um vizinho me disse que ouviu muitos gritos e objetos sendo quebrados, mas ele disse que não chamou a polícia porque não iria adiantar, ela iria negar as agressões. O vizinho disse que de repente o barulho parou. Ele achou que tinham feito as pazes. No dia seguinte recebi um telefonema do síndico do prédio pedindo que eu e minha mãe fôssemos até o apartamento de Silvana porque havia algo de estranho dentro do apartamento. Tinham manchas de sangue escorrendo embaixo da porta. Fui desesperada com minha mãe, e a polícia já estava lá. Subimos e vimos aquele sangue escorrendo embaixo da porta. Quando os policiais arrombaram a porta, não acreditei no que vi, minha irmã morta com diversas facadas pelo corpo e no rosto. Nunca mais vou esquecer aquela cena".

Os procedimentos foram feitos e Felipe estava foragido. Dois dias depois do crime, ele se apresentou à polícia com um advogado. Ele alegou que "perdeu a cabeça" em uma briga e que Silvana disse que iria deixá-lo. Por "ama demais", não conseguiria viver sem Silvana, e fez essa loucura, mas estava muito arrependido. O delegado de polícia representou pelo pedido de prisão preventiva de Felipe, que foi deferido pelo judiciário, e atualmente ele está preso, aguardando julgamento. D. Ester olhando para mim, terminou a conversa dizendo, "eu pedi tanto para minha filha deixar esse monstro, mas ela não me ouviu. Fiz tudo o que podia para salvar minha filhinha, mas não consegui, não tenho mais forças para viver".

Amigas, a dor sofrida por D. Ester e Carolina é a mesma de muitas mães que vêem suas filhas sendo maltratadas nas mãos de homens agressores e não conseguem ajudar. Até hoje Carolina não entende o porque de Silvana ter crescido tanto profissionalmente, ter a independência financeira, e não ter conseguido deixar um homem agressor. A resposta que dou a Carolina é a de que muitas mulheres crescem profissionalmente, mas não crescem emocionalmente. Qualquer dependência fragiliza. Ninguém pode depender do amor do outro para ser feliz.

Analisando o caso de Silvana, observamos que ela traçou planos, objetivos e estava conquistando tudo o que sonhou. Felipe só entrou na vida dela para destruir todos os projetos de vida dela. E só conseguiu porque ela não estava emocionalmente preparada para viver uma relação amorosa conflituosa. Ela não conseguiu enxergar quem era Felipe. A percepção que ela tinha dele, era totalmente distorcida da realidade. Como Silvana, muitas mulheres transformam homens agressores em Príncipes encantados, que só existem em suas fantasias. No relacionamento, a mulher precisa de um companheiro que caminhe com ela, ao lado dela. Ela não precisa de um homem que sabote os seus sonhos e objetivos. O sabotador, fatalmente irá destruir os sonhos e a vida da mulher. Por isso amiga, não coloque a sua vida, os seus sonhos nas mãos de um homem dominador. Não faça como Silvana que colocou a vida e a morte nas mãos de Felipe. Tome a sua vida nas suas mãos, e escolha ser feliz!

VOCÊ NÃO ESTÁ SOZINHA!

EM QUAIS ÓRGÃOS BUSCAR AJUDA VIOLENCIA CONTRA A MUHER:

• Centro de Referência Clarice Lispector – (81) 3355.3008/ 3009/ 3010
• Centro de Referência da Mulher Maristela Just - (81) 3468-2485
• Centro de Referência da Mulher Márcia Dangremon - 0800.281.2008
• Centro de Referência Maria Purcina Siqueira Souto de Atendimento à Mulher – (81) 3524.9107
• Central de atendimento Cidadã pernambucana 0800.281.8187
• Central de Atendimento à Mulher do Governo Federal - 180
• Polícia - 190 (se a violência estiver ocorrendo) - 190 MULHER

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