A mulher e a lei

''Sou mulher de bandido''

Por Gleide Ângelo
Por Gleide Ângelo
Publicado em 30/01/2017 às 7:00
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 "Peguei apenas as minhas roupas e fui para casa de minha mãe, não queria mais nada dele", disse a entrevistada / Foto: Heudes Régis/JC Imagem

"Peguei apenas as minhas roupas e fui para casa de minha mãe, não queria mais nada dele", disse a entrevistada Foto: Heudes Régis/JC Imagem

Caros leitores, 

No artigo de hoje (30/01) falarei sobre o depoimento de uma mulher que se rotula "mulher de bandido". Conversei com essa mulher, que chamarei pelo nome fictício de LUCIANA. Em nossa conversa, LUCIANA narrou todo o sofrimento depois que se envolveu com um presidiário e não consegue deixá-lo, pois diz que sofre constantes ameaças de morte.  

Tudo se iniciou quando LUCIANA foi ao presídio com uma amiga que iria fazer uma visita ao irmão. Nessa visita, LUCIANA conheceu ADRIANO (fictício), um homem que estava preso há oito anos pelos crimes de homicídio, tráfico de drogas e roubo. Ela disse, "quando o conheci, ele me contou toda a sua história de vida, que foi abandonado pelos pais e viveu nas ruas desde cedo. Por isso ele conheceu pessoas erradas e foi acusado injustamente de crimes que nunca cometeu. Ele falou com tanta sinceridade nos olhos, que tive muita pena dele. A partir daquele dia, todos os domingos eu ia visitá-lo".

No início, LUCIANA disse que viveu um conto de fadas, com um homem bom, que estava sendo injustiçado pela sociedade. Com um mês de relacionamento, LUCIANA já estava frequentando os encontros conjugais no presídio. E nesse mesmo mês, ADRIANO começou a transferir dinheiro para a conta de LUCIANA. Os valores dos depósitos foram aumentando e LUCIANA começou a comprar tudo o que sempre desejou. 

Com seis meses de relacionamento LUCIANA se mudou para um casa que ADRIANO comprou. Ele deu um carro a LUCIANA, mas tudo no nome dele. LUCIANA narra, "nunca questionei porque a casa, o carro, os móveis eram tudo comprados no nome dos amigos dele. Eu estava tão feliz, com um homem bom, que me amava e morando em uma casa luxuosa, com um carro, isso era a única coisa que importava". Perguntei a LUCIANA se ela nunca se  questionou de onde vinha todo esse dinheiro, afinal ADRIANO estava preso e não tinha família rica. Ela respondeu, "no início, quando ele começou a me dar dinheiro, perguntei de onde vinha o dinheiro. Ele me disse que era uma pessoa bem relacionada e tinha muitos amigos que o ajudavam. Na realidade, eu não me importava de onde vinha o dinheiro, pois estava muito feliz e confiava nele". 

Continuamos conversando e a história de conto de fadas de LUCIANA foi se transformando em um filme de terror. Com um ano de relacionamento, LUCIANA estava vivendo bem, comprando roupas caras, joias, e resolveu voltar a estudar. Na visita íntima no presídio, ela disse a ADRIANO que estava querendo voltar a estudar, pois queria ter uma profissão. Inesperadamente, ADRIANO se transformou e começou a xingá-la. LUCIANA relembra, "foi horrível, ele me chamou de tudo o que não presta, disse que eu estava o traindo e que eu estava me arrumando para outros homens. Em seguida ele me deu um murro no rosto e comecei a gritar por socorro. Uma senhora que estava visitando o marido me socorreu. Ela mandou que ele parasse e me tirou daquele local". 

Quando chegou em casa, LUCIANA estava toda machucada, chorando muito. "Eu estava envergonhada. Como pude acreditar que aquele homem violento era uma pessoa boa. Ele se transformou, pensei que iria morrer". Com medo, LUCIANA não foi para as próximas visitas. Ela começou a receber telefonemas de ADRIANO a ameaçando de morte, dizendo que se ela não fosse visitá-lo, seria uma mulher morta, pois tinha muitos amigos fora do presídio que fariam o "serviço" para ele". 

Assustada, LUCIANA resolveu sair de casa e deixou o carro na garagem. "Peguei apenas as minhas roupas e fui para casa de minha mãe, não queria mais nada dele". Mas as ameaças continuaram, e LUCIANA ficava cada vez mais assustada com o tom de voz de ADRIANO. Ele dizia que tudo na vida tinha um preço e que o preço do luxo que ela teve era o de continuar fazendo tudo o que ele quisesse. A mãe de LUCIANA a aconselhou a procurar a policia e denunciar ADRIANO, mas ela disse que não queria, que tinha medo dele. 

Um mês depois, LUCIANA voltou a visitar ADRIANO como se nada tivesse acontecido. Ele a convenceu a retonar para a casa. Perguntei a LUCIANA o porque dela não ter denunciado ADRIANO à polícia e ter voltado para ele. Ela pensou e disse, "todo homem é assim, agressivo, violento. Meu pai era assim, meus tios também. Então, cheguei a conclusão que era melhor ficar com ele, pelo menos tenho uma vida confortável. Se eu não fizer nada que ele não goste, viverei bem com ele". Encerrei a conversa perguntando: você é feliz?, e ela me respondeu, "sou mais feliz  do que minha mãe e minhas tias, pois tenho um marido que me dá tudo o que quero. Tenho consciência que sou mulher de bandido e não tenho como mudar isso".

É muito triste ouvir uma história como a de LUCIANA. Uma mulher que viu a mãe e as tias sofrendo, mas acreditou que sua história seria diferente. A busca de um grande amor deixou LUCIANA sem enxergar a verdadeira personalidade de ADRIANO. Ela não queria ver a verdade, preferiu acreditar na história dele, pois era mais conveniente para ela. Esse é o problema de muitas mulheres, preferem acreditar na fantasia que criam e não querem enxergar a realidade.Ela nunca procurou saber sobre os crimes que ele praticou, sobre a origem do dinheiro que ele lhe dava, pois estava tudo tão bom que não valia a pena mudar. Hoje ela está com ele por comodidade, e continua sendo agredida fisicamente e moralmente.

Amigas, por mais difícil que seja a vida, não vale a pena ficar com um homem agressor pelo fato dele te sustentar e te dar um vida confortável. A sua dignidade e seu amor próprio não podem ser comprados. Você tem um valor que não tem preço. Por isso, não permita que ninguém te agrida moralmente, psicologicamente e fisicamente. Olhe para trás e veja tudo o que você conquistou sozinha, com seus esforços. Invista em você, trace objetivos e siga o seu caminho. Na sua vida não tem espaço para sofrimento e agressões. Não se rotule, "eu sou um fracasso", "eu sou mulher de bandido".  Não faça como LUCIANA que continua em um relacionamento destrutivo para ter uma vida financeira confortável, denuncie o agressor. Você é uma mulher forte e independente e a sua maior riqueza é o amor próprio e o respeito que todos devem ter por você. Levante a cabeça e siga em frente, supere a dor e  diga para si mesma, eu sou vencedora! 

Você não está sozinha!

Em que órgãos buscar ajuda em casos de violência contra a mulher:

- Centro de Referência Clarice Lispector – (81) 3355.3008 // 3009 // 3010
- Centro de Referência da Mulher Maristela Just - (81) 3468.2485
- Centro de Referência da Mulher Márcia Dangremon - 0800.281.2008
- Centro de Referência Maria Purcina Siqueira Souto de Atendimento à Mulher – (81) 3524.9107
- Central de atendimento Cidadã pernambucana 0800.281.8187
- Central de Atendimento à Mulher do Governo Federal - 180
- Polícia - 190 (se a violência estiver ocorrendo)

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