A mulher e a lei

Olhar de desprezo, palavra humilhante e tom ameaçador também são formas de violência

Por Gleide Ângelo
Por Gleide Ângelo
Publicado em 12/12/2016 às 7:42
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Delegada destaca o livro da psiquiatra e psicoterapeuta de família Marie-France  / Foto: Heudes Régis/JC Imagem

Delegada destaca o livro da psiquiatra e psicoterapeuta de família Marie-France Foto: Heudes Régis/JC Imagem

Caros leitores, 

No artigo de hoje, falarei sobre as atitudes que constituem a violência contra a mulher, que na maior parte das vezes é fundada no controle e na violência psicológica. A psiquiatra e psicoterapeuta de família Marie-France Hirigoyen escreveu no livro “A Violência no Casal”, às etapas da violência psicológica, que vai destruindo a mulher aos poucos, de forma cruel e silenciosa.

No livro, Marie-France Hirigo relata, “violência física e violência psicológica estão interligadas: homem algum vai começar a espancar sua mulher da noite para o dia, sem razão aparente, em uma crise de loucura momentânea. A maior parte dos cônjuges violentos primeiro prepara o terreno, aterrorizando a companheira. Não há violência física sem que antes tenha havido violência psicológica. Porém, somente a violência psicológica, como no caso da violência perversa, pode trazer grandes desgastes. Muitas das vítimas dizem que é a forma de abuso mais difícil de aguentar no quadro da vida de um casal.”

A escritora continua, “Trata-se de um maltrato muito sutil: muitas vezes as vitimas dizem que o medo começa com um olhar de desprezo, uma palavra humilhante, um tom ameaçador. Trata-se de, sem desferir qualquer golpe, causar um mal estar no parceiro ou parceira, de criar uma tensão, de amedrontá-lo, a fim de mostrar o próprio poder. Há, evidentemente, certo gozo em dominar o outro com um simples olhar ou uma mudança no tom de voz.” 

É exatamente isso que observo nas vítimas de violência doméstica que chegam aos plantões e que me enviam mensagens, mulheres assustadas com medo dos companheiros. Quando converso com essas mulheres, observo que elas estão tão destruídas emocionalmente, que não conseguem enxergar uma saída para o seu sofrimento. É como se elas estivessem em uma prisão sem enxergar os caminhos para a liberdade.

A psiquiatra Marie-France Hirigoyen diz quais são as atitudes que constituem microviolências que são difíceis de detectar. 

ATITUDES QUE CONSTITUEM MICROVIOLÊNCIAS

» O CONTROLE. Se situa primeiramente no registro da posse, que é vigiar alguém de maneira maldosa com a ideia de dominá-lo e dirigi-lo. Quer controlar tudo para impor a maneira pela qual as coisas devem ser feitas.

» O ISOLAMENTO. Para que a violência possa perdurar é preciso isolar progressivamente a mulher de sua família, de seus amigos, impedi-la de trabalhar, de ter uma vida social. Isolando sua mulher, o homem faz com que sua vida fique voltada unicamente para si. Ele precisa que ela se ocupe dele, que só pense nele. Age de modo a que ela não seja demasiado independente, para que não escape ao seu controle. As mulheres dizem muitas vezes que se sentem prisioneiras.

» O CIÚME PATOLÓGICO. A inclinação para o ciúme acontece a partir de um sentimento de desvalorização do homem que, em vez de se pôr em questão, explica sua frustação pela infidelidade de sua parceira. O ciúme pode se dirigir ao passado da mulher e, no caso, o homem fica remoendo acontecimentos sobre os quais não tem o menor controle, por serem passados. De maneira geral, nenhuma explicação racional consegue acalmar um ciúme patológico, pois se trata nada mais, nada menos, de uma recusa da realidade.

» O ASSÉDIO. São, por exemplo, discussões infindáveis para extorquir confissões, até que a pessoa, por exaustão, acabe cedendo. Outra estratégia consiste em vigiar a pessoa, segui-la pela rua, assediá-la por telefone, esperá-la à saída do trabalho. Essa forma de violência se produz, na maior parte das vezes, após uma separação.

» O AVILTAMENTO. O propósito aqui é atingir a autoestima da pessoa, mostrar-lhe que ela não vale nada, que não tem o menor valor. A violência se manifesta em forma de atitudes de desdém e palavras ferinas, expressões depreciativas e observações desagradáveis.

» AS HUMILHAÇÕES. Humilhar, ridicularizar é algo que caracteriza a violência psicológica. O outro, sendo apenas uma válvula de escape da raiva que alguém tem de si mesmo, não possui existência própria: não é respeitado.

» OS ATOS DE INTIMIDAÇÃO. Bater portas, quebrar objetos para expressar seu mau humor constituem atos de intimidação. Quando uma pessoa descarrega esses humores sobre objetos, o parceiro ou parceira pode interpretar isso como uma forma de violência controlada. Trata-se, no entanto de uma violência indireta. A mensagem que se passa ao outro é: “Olha a minha força! O que posso fazer com você!”

» A INDIFERENÇA ÀS DEMANDAS AFETIVAS. A violência moral é igualmente a recusa em demonstrar qualquer interesse pelo outro. É mostrar-se insensível ou desatento para com sua parceira ou seu parceiro, além de demonstrar abertamente sua rejeição ou seu desprezo.

» AS AMEAÇAS. A violência psicológica pode levar a ameaças: a de tirar as crianças, de negar-se a dar dinheiro, de espancar, de se suicidar. Pode se sugerir que haverá represálias contra todos que estão ao redor se a mulher não agir como se espera dela. O que importa é alimentar, desse modo, o poder sobre o outro. 

Analisando todas essas microviolências descritas no livro pela psiquiatra Marie-France Hirigoyen, verificamos que as mulheres não passam necessariamente por todos esses tipos de violências. Mas, essas violências estão tão interligadas, que fazem parte do cotidiano de muitas mulheres que sofrem violência doméstica. Essa violência é o marco inicial para a violência física e o feminicídio (homicídio de mulheres).

Por isso, o que tenho a dizer a você, que se identificou com essas microviolências, é que não deixe a violência evoluir. Não permita que o agressor te humilhe, te maltrate, te isole de tudo e de todos. Você precisa ficar mais perto dos amigos, vizinho, familiares para que as pessoas tenham conhecimento do seu problema e possam te ajudar. Fale, denuncie, se afaste do agressor, pois só assim você conseguirá dar outro rumo à sua vida e superar a dor. Transforme todo esse desamor em combustível para você encontrar o verdadeiro amor. E o primeiro amor de sua vida é você mesmo, pois a partir do momento em que você se amar você não permitirá que nenhum agressor te machuque e te maltrate. A pessoa mais importante da sua vida é você, por isso se ame mais, se cuide mais, seja feliz!

VOCÊ NÃO ESTÁ SOZINHA!

EM QUAIS ÓRGÃOS BUSCAR AJUDA:

Centro de Referência Clarice Lispector – (81) 3355.3008/ 3009/ 3010

Centro de Referência da Mulher Maristela Just - (81) 3468-2485

Centro de Referência da Mulher Márcia Dangremon - 0800.281.2008

Centro de Referência Maria Purcina Siqueira Souto de Atendimento à Mulher – (81) 3524.9107

Central de atendimento Cidadã pernambucana 0800.281.8187

Central de Atendimento à Mulher do Governo Federal - 180

Polícia - 190 (se a violência estiver ocorrendo)

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