Saúde Pública

Emergência da Restauração exige longas esperas por boas notícias

MARÍLIA BANHOLZER
MARÍLIA BANHOLZER
Publicado em 21/10/2015 às 17:50
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Sala de espera vira dormitório de acompanhantes que seguem no HR aguardando novidades / Foto: Marília Banholzer/NE10

Sala de espera vira dormitório de acompanhantes que seguem no HR aguardando novidades Foto: Marília Banholzer/NE10

“Sala de espera” é um eufemismo perto do que acontece na emergência adulta do Hospital da Restauração (HR), localizado no Derby, área central do Recife. Familiares aguardam notícias enquanto pacientes esperam por vagas, seja em leitos, Unidades de Tratamento Intensivo (UTI) ou por transferências. Segundo os acompanhantes dos pacientes, a entrada do setor se transforma durante a noite, quando diversas pessoas esticam seus colchões e dormem para mais um dia de espera.

Há nove dias, uma costureira que mora na Zona Norte do Recife mudou sua rotina depois que o filho de 19 anos sofreu um acidente de motocicleta e deu entrada no HR. O jovem teve diversas fraturas no corpo e traumatismos cranianos. Os médicos disseram à mãe do rapaz que ele ficaria internado na chamada Sala Vermelha, onde estão pacientes em estado grave. O atendimento desse setor, no entanto, não é suficiente frente às gravidades dos ferimentos. A transferência para um leito de UTI seria o mais indicado, mas não há vagas. 

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“O médico disse que ele precisava ir para a UTI e que, do jeito que está, provavelmente não vai ter uma melhora rápida. Faz mais de uma semana que estamos aguardando por uma novidade boa. O máximo que a gente fica sabendo é que a lista de espera pela UTI só faz crescer. Antes era uma lista numa página, agora já tem umas três folhas”, relatou a costureira. 



Quem também vive um novo dia a dia de espera por notícias é o vigilante José Severino Cordeiro, 40 anos, que está há 30 dias acompanhando o primo, José Luiz da Silva, mesma idade, espancado e levado ao HR para os cuidados ideais. Os dois moram em Garanhuns, no Agreste pernambucano, mas a gravidade dos ferimentos fizeram o paciente ser trazido ao Recife e ficar internado na Sala Laranja (menos grave do que a Sala Vermelha).

“Nesse mês, eu tive poucas informações concretas sobre o estado de saúde do meu primo. Há uns oito dias o médico disse que ele precisava ser transferido para outro hospital, mas, até agora, só estamos esperando uma vaga em algum aqui do Recife mesmo e nada”, explicou o vigilante Severino Cordeiro.

HR é a maior unidade da rede de saúde pública do Estado de Pernambuco e o maior e mais complexo serviço de urgência e trauma do Norte/Nordeste. O centro médico é especializado em Traumato-ortopedia, Cirurgia Geral, Cirurgia Vascular Periférica, Cirurgia B


Nos dois casos, a vida de acompanhante de paciente do HR os fez se afastarem de seus empregos, uma vez que ambos decidiram “se internar” no hospital junto com seus familiares. Tanto a costureira que mora no Recife quanto o vigilante residente de Garanhuns entendem que é necessário passar o dia inteiro na unidade de saúde porque, segundo eles, a qualquer momento funcionários do hospital podem chamar para dar notícias. 

A mãe do acidentado de moto só vai para casa à noite para dormir e voltar no dia seguinte. O primo do homem espancado disse contar com a solidariedade de outros familiares que moram na capital pernambucana para se alimentar e dormir - caso contrário, teria que dividir o chão da sala de espera com os demais acompanhantes. “Tive sorte por ter onde dormir. Mas essa vida não está fácil, já gastei uns R$ 500 só de lanche. É um dinheiro que a gente tira de onde não tem”, comentou o vigilante.   

Ambulantes se instalam na entrada da unidade de saúde

Ambulantes se instalam na entrada da unidade de saúdeFoto: Marília Banholzer/NE10

AMBULÂNCIAS - Nas três horas que a reportagem do NE10 esteve na sala de espera da emergência adulta do HR, na tarde desta quarta-feira (21), pelo menos cinco ambulâncias chegaram com pacientes apresentando algum tipo de trauma. Todos precisaram ser registrados na portaria do setor e seguiram corredor adentro. O movimento no local era tranquilo, pessoas dormindo nas poltronas, distraindo-se ouvindo música ou mexendo no celular. O vai e vem de acompanhantes só aumentou por volta das 14h, quando começaram os horários de visitas aos pacientes de cada uma das salas - vermelha, laranja, amarela(casos menos graves).

O espaço estava aparentemente sujo e degradado, longe do esperado de um lugar que passou por uma significativa reforma e ampliação em abril de 2014, ainda sob a batuta do ex-governador Eduardo Campos. Localizado às margens de uma das principais avenidas do Recife, a Agamemnon Magalhães, o hospital sofre com a sujeira vinda da rua que se espalha na entrada da unidade. A rampa de acesso vira “local de descanso” de moradores de rua. Em meio a tudo isso, o som das sirenes que circulam nas proximidades do Hospital da Restauração não dá trégua.

Em resposta aos problemas reclamados pelos acompanhantes dos pacientes, a assessoria de comunicação do HR explicou que “o acompanhamento das vagas da UTI é de responsabilidade da Central de Regulação de Leitos. O paciente que fica na sala vermelha tem acesso a todos equipamentos semelhantes ao de uma UTI e ainda conta com uma equipe multidisciplinar com neuro, cirurgião-geral, ortopedista”. 

Já sobre a espera diária pela transferência para outra unidade de saúde do Recife, a  resposta do HR foi de que José Luiz é um paciente de estado crônico (por ser dependente químico) e “deve ser transferido para o Hospital Otávio de Freitas” - especializado em dependência química. Mas isso depende das vagas de lá, e não há previsão para o procedimento. 
Ainda sobre esse caso, a Secretaria Estadual de Saúde (SES) enviou a seguinte nota oficial: 

“A Secretaria Estadual de Saúde (SES) esclarece que a ampliação da oferta de leitos de UTI é uma prioridade da gestão. Nos últimos anos, o número de leitos de Terapia intensiva no Estado mais que triplicou. Atualmente, além de novos leitos construídos na rede própria, o Pernambuco contra, junto à rede privada e conveniada, toda a oferta de leitos de UTI disponíveis.  No entanto, a epidemia do trauma é um dos fatores determinantes para ainda haja, em determinados momentos, uma demanda excessiva por esse tipo de tratamento. A fila de espera, no entanto, é bastante dinâmica e uma vaga pode surgir a qualquer momento. Enquanto aguardam transferência para um leito de UTI, os pacientes são acompanhados na emergência ou enfermaria por equipes multiprofissionais e capacitadas, além de receberem todo o suporte de equipamentos e medicamentos de última geração.”

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