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Empreendedorismo ganha força em meio à turbulência na economia

MARÍLIA BANHOLZER
MARÍLIA BANHOLZER
Publicado em 05/10/2015 às 17:33
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Boas ideias têm gerado negócios de sucesso mesmo em tempos de crise econômica / Foto: reprodução

Boas ideias têm gerado negócios de sucesso mesmo em tempos de crise econômica Foto: reprodução




Comprar um carro, casar e formar uma família, viajar para o exterior. Nada disso é mais importante para cerca de 31,4% dos brasileiros do que abrir seu próprio negócio. Em ano de crise econômica e política, realizar esse sonho pode parecer mais distante para alguns. Para outros, no entanto, não há momento mais oportuno. De acordo com a pesquisa Global Entrepreneurship Monitor (GEM), realizada no Brasil pelo Sebrae e pelo Instituto Brasileiro de Qualidade e Produtividade (IBQP), o País conta com cerca de 130,7 milhões de empreendedores, ou seja, 34,5% brasileiros com idades entre 18 e 64 anos.

Somente no primeiro quadrimestre deste ano, foram abertos 21.147 novos negócios em todo o Estado, segundo dados da Junta Comercial de Pernambuco. Esse número é 0,34% maior do que o registrado no mesmo período do ano passado, quando foram constituídos 21.075 negócios. “Apesar da crise econômica enfrentada pelo Brasil, esses dados sinalizam uma tendência de que o número de abertura de negócios em Pernambuco continuará em alta em relação ao ano anterior, a exemplo do que vem sendo registrado nos últimos cinco anos”, afirma a presidente da Jucepe, Terezinha Nunes.

Além disso, quando isolado apenas o grupo do Micro Empreendedor Individual (MEI), é possível destacar o número crescente dessa categoria de empresário. Recentemente o programa completou 5 milhões de cadastros, com uma média de 100 mil formalizações por mês. Um importante reflexo deste dado é que, enquanto as grandes e médias empresas demitiram mais de 500 mil trabalhadores entre 2011 e 2015, as microempresas contrataram mais de 5 milhões no mesmo período.


Fonte: Global Entrepreneurship Monitor | Arte: Marília Banholzer/NE10

Nessa onda empreendedora, a administradora de empresas Cristiane Cajueiro, 30 anos, viu na demissão do marido uma oportunidade para investir no ramo alimentício. Aproveitando parte do valor da recisão trabalhista, o casal decidiu abrir um self-service no bairro de Candeias, em Jaboatão dos Guararapes, Grande Recife. Segundo ela, com o investimento inicial de aproximadamente R$ 15 mil foi possível adquirir a maior parte dos objetos necessários para abrir o negócio, como panelas, freezers etc.

“Hoje (05.10) faz exatamente um mês que a gente abriu o Delisabor, que agora é a renda principal da nossa casa. Eu mesma cozinho e fico no caixa, meu marido fica servindo os nossos clientes”, explicou Cristiane. Segundo ela, o pequeno restaurante está indo bem mesmo em período de crise: “Não deu medo de investir porque a gente vende comida, um bem essencial. Mesmo aqueles que levam comida de casa para o trabalho, tem dias que quer comer na rua. Nosso papel hoje é oferecer comida boa com preço em conta. Para garantir nosso clientes nós estamos lutando pela fidelização deles, por isso oferecemos algumas cortesias.”

Ainda mais audacioso foi o administrador Everton Leão, 23 anos. Em maio de 2014 ele pediu demissão da empresa onde trabalhava para correr atrás do sonho de empreender. Um mês após a saída ele abriu a FEH Solution, negócio que oferece soluções tecnológicas para empresas. “Quando ainda estava na empresa que eu trabalhava comecei a desenvolver planilhas e ferramentas de automação de processos internos. Foi aí que começaram a surgir clientes e decidi arriscar abrindo meu próprio negócio”, lembrou ele que hoje tem um funcionário e um faturamento bruto de R$ 40 mil por ano.

A maioria das pequenas empresas fecham nos primeiro dois anos, e todas só podem se considerar estabelecidas após cinco anos de mercadoAmanda Aires, economista
Everton ainda buscou se especializar concluindo uma pós-graduação em Gestão da Tecnologia da Informação e Comunicação. “Hoje nós temos um escritório em Jaboatão e para driblar a crise econômica que afeta todo mundo estamos buscando diversificar nossos serviços, oferecendo treinamentos, consultorias, além de ampliar a divulgação da nossa marca”, avaliou o jovem empreendedor.

Para a economista Amanda Aires, o crescimento do números de Micro Empreendedor Individual pode ser um reflexo da dificuldade das pessoas de se colocarem no mercado de trabalho. Segundo ela, abrir o próprio negócio nem sempre está relacionado com a vontade de empreender, mas sim de buscar uma alternativa para se manter. “Outro dado importante é que a maioria das pequenas empresas fecham nos primeiro dois anos, e todas só podem se considerar estabelecidas após cinco anos de mercado. Por isso é preciso estar atento aos dados de crescimento no empreendedorismo também no ponto de vista da mortalidade das empresas”, ressaltou a especialista que é professora de Economia da Faculdade Boa Viagem, no Recife.

Apesar dos números positivos para as micro e pequenas empresas, dados da Secretaria da Micro e Pequena Empresa (SMPE) - extinta nesta mês de outubro após a reforma ministerial -, com bases nos cadastros das Juntas Comerciais de todo o País, apontam que cresce a proporção de empresas que têm optado por encerrar as atividades em comparação àquelas que abrem as portas.

De janeiro a agosto deste ano, por exemplo, cerca de 252 mil empresas deram baixa em seus registros nas juntas comerciais do País, representando 81,4% do total de 310 mil abertas no mesmo período. Em 2014 essa proporção esteve na casa dos 52%, enquanto em 2013 não passava dos 36%. Os dados, porém, precisam ser analisados com atenção, já que desde agosto de 2014 a lei complementar 147 tornou mais simples o processo de fechamento de uma empresa. Esse aumento, por exemplo, pode ser resultado do represamento de mais de 1 milhão de firmas inativas que não haviam encerrado suas atividades formalmente.

Uma das empresas que fecharam as portas e permaneceram com as documentações ativas foi a loja de roupas femininas e masculinas que funcionava no bairro de Jardim Atlântico, em Olinda, no Grande Recife, e este ano encerrou as atividades. A proprietária do espaço, Elizabeth Chamié, 30 anos, conta que o empreendimento tinha apenas um ano e a decisão de encerrar as atividades está pautada, exclusivamente, em problemas pessoais. “Tenho o MEI desde 2012, vendia roupas de porta em porta e, no ano passado, decidir ter uma loja fixa. Só que eu não conseguia conciliar as atividades de casa com o comércio. Agora eu fechei o negócio e estou me desfazendo do restante das peças, mas ainda não dei baixa nas documentações”, ressaltou.

Lojas dos tipo bomboniere não têm dado bom retorno financeiro

Lojas dos tipo bomboniere não têm dado bom retorno financeiroFoto: reprodução

O momento de turbulência também os antigos empreendedores repensarem suas atividades. Dono das microempresas T&T Bomboniere e Festas, Bombons e Cia, o economista Josemir Miranda, 51 anos, admite que os dois negócios já passaram por dias melhores. A ideia de abrir uma bomboniere surgiu em 1991 quando trabalhava em um banco e foi demitido por ser da chefia e fazer greve, atitude que não era admitida na época. A mãe de um amigo dele tinha um ponto e disse que não precisava de muito investimento para montar uma, fazendo-o alavancar nos investimentos. Hoje, a estória é outra: ele já cortou ventilador, alguns computadores, hora extra não se faz mais.

"Desde o ano passado que o movimento vinha caindo, mas não se notava pelos investimentos fortes em Suape e com a Copa do Mundo iludindo os comerciantes na expectativa de boas vendas. Quando percebi foram os juros subindo, o dólar. O estoque parado e ninguém para comprar", conta Josemir. Ao ser questionado se, nas circunstâncias de hoje, ainda optaria por abrir a microempresa, o economista recua: "Hoje eu tentaria ser funcionário por causa da crise, mas não deixaria de tentar ter um negócio. Mas digo: quem tenta os negócios só vive endividado porque são vários obstáculos. Os preços dos produtos aumentaram mais de 30%, mas não pode aumentar para o consumidor, tendo que viver com a mesma renda e uma despesa maior", complementa. 

CAMPANHA DO SEBRAE - Nesta segunda-feira, 5 de outubro, o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) celebra o Dia Nacional da Micro e Pequena Empresa. Para marcar a data foi criada a campanha “Compre do Pequeno Negócio”, com o objetivo de estimular a compra nas pequenas empresas. A ideia é fortalecer a economia através da força dos pequenos negócios (mais de 10 milhões de empresas no Brasil) que faturam cerca de R$ 3,6 milhões por ano.

Na Miranda Tecidos, proprietário e funcionários abraçaram a campanha do Sebrae

Na Miranda Tecidos, proprietário e funcionários abraçaram a campanha do SebraeFoto: cortesia

O empresário do ramo de confecções Pedro Miranda, proprietário de uma loja de tecidos em Caruaru, no Agreste de Pernambuco, abraçou a causa e aproveitou a campanha para se capacitar, oferecer cursos aos seus funcionários, e fazer marketing de seu empreendimento. “Eu faço parte de um grupo de lojistas localizado no entorno da Feira da Sulanca, aí quando o Sebrae nos falou dessa campanha a gente se mobilizou para aproveitar toda estrutura de cursos que eles estavam oferecendo”, revelou o dono da Miranda Tecidos, que conta com quatro funcionário e existe desde 1993.

Ainda segundo o empresário, a campanha “Compre do Pequeno Negócio” funciona muito mais como  vitrine para mostrar aos consumidores as vantagens de comprar das lojas menores do que com estratégia de venda dos produtos. “Não é pra fazer promoção, é para mostrar que nossos negócios são importantes para a região, como até fizemos uma pesquisa e descobrimos que o micro e pequeno empreendedor é o DNA de 90% dos lojistas aqui da região”, pontuou Pedro Miranda.

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